domingo, março 27, 2011

Quem é você?

Muitas vezes eu presenciei ataques, mortes, entre outras coisas. E em muitas delas eu era o caçador. Eu gosto, confesso. Divertia-me com os gritos, com a agonia, com o poder, a dominação que lhes era imposta por nós. Mas ali, naquela hora… Algo havia mudado em mim. Receio que, após ver Sophia morrendo na minha frente, sem poder fazer nada para impedir… Eu não podia continuar ali, parado, vendo Zafrina ir à direção daquela garota, salivando por seu sangue, sua vitalidade…
Não seria eu mais o mesmo?
– Zafrina!
Ela parou á alguns passos á minha frente. Virou-se para me encarar. E o sorriso zombateiro em seu rosto fez-me sentir um idiota por fazer tal coisa.
– Sim?
– Você deixaria que um velho amigo apreciasse o melhor produto, com um presente de boas-vindas?
Ela olhou para a garota, parada a alguns passos de nós. Depois se voltou para mim, sorridente.
– Mas é claro que sim! Divirta-se!
Forcei um sorriso, agradecendo-lhe. E ela voltou a escorar-se no balcão, observando-me.
Atravessei o salão. Indo na direção da garota, mas parei ao seu lado.
– Pode me conseguir uma água? – pedi ao barman na bancada, em que a maioria dos jovens estavam escorados.
Ele concordou e saiu. Pude sentir os olhares das garotas sobre mim. Era fascinante como o simples fato de estar morto trazia para mim inúmera coisas que os simples mortais desejavam, mas não conseguiam com tal facilidade.
Arrisquei um simples olhar: todas ali sorriam para mim.
A garota morena colocou-se entre mim e a ruiva.
– Olá! – cumprimentou-me.
Não respondi.
Eu sabia exatamente o que fazer: olhei para a garota ruiva, bem dentro de seus olhos verdes como esmeraldas. Eu não saberia dizer qual seria o nome dela. Mas não foi difícil descobrir seu apelido, pois o garoto imaturo não parava de repeti-lo: Becky.
– Olá!
A morena fitou a amiga, boquiaberta. Olhava de mim para ela, e depois saiu bufando, irritada. Becky não respondeu. Apenas acompanhou a amiga com os olhos, depois os abaixou para seus próprios pés.
– Acho que sua amiga ficou chateada. – continuei.
– Ela vai superar. – ela sorriu, olhando para mim. – Sou Rebecca!
– Sylas. – falei, aceitando a garrafa de água que o barman me entregava.
– Nome diferente. – ela murmurou.
– Conheço pessoas com nomes mais engraçados que o meu.
– Seu nome não é engraçado. – ela protestou. – É legal, apenas… diferente.
– Eu sou diferente.
– Mesmo? Eu também.
Não entendi o que ela quis dizer com aquilo. Fiquei ali, paralisado, fitando-a. Em que sentido ela seria diferente? Saberia ela sobre o que eu me referia?
Após um minuto, ou talvez dois… Não sei dizer. Ela sorriu. Seus lábios pareciam terem sido desenhados em seu rosto, de tão suave que lhe era a expressão. Trazendo-me a mente uma imagem semelhante, onde Sophia sorria animada e despreocupada. Andando levente pelos aposentos, como se nada pudesse abalá-la ou... Balancei a cabeça, confuso, e lancei um olhar para Zafrina.
Um terrível erro, devo dizer.
Ela estava lá, observando-me. Quando a vi, ela acenou para mim.
– Sua amiga se veste de uma maneira estranha, não?
Voltei-me para Rebecca. Surpreso.
Certo. Zafrina não é bem o tipo que tenta parecer um humano normal. Ela ainda se veste com as mesmas roupas de sua época: vestidos longos, espartilhos, e todos esses outros acessórios. Muito discreta, não? Mas ela ainda se achava na moda. Por mais que naquela noite usasse a "moda" de uns sete anos atrás.
– Ah, Zafrina?! Ela é obcecada pela moda antiga! Ninguém consegue fazer com que ela tente se atualizar.
– Zafrina? – ela olhou curiosa para o outro lado do salão. – Ela é um dos seus amigos de nomes engraçados?
– É. Ela é sim. – sorri.
– Tem razão!… São realmente engraçados. – ela riu.
– Becky, já estamos indo! – a garota morena aproximou-se de nós. – Vamos?
– Ah, claro! – ela respondeu, em seguida virou-se para mim. – Foi bom falar com você, Sylas! Até outro dia.
– A gente se vê... – murmurei atônito.
Depois ela saiu. Acompanhando seus amigos. Saindo para a noite. Andei até a porta e parei. Pude ouvir o uivar da noite, juntando-se ao vento que lhe soprou os cabelos. Mas ela não olhou para trás.
Em que sentido ela seria diferente?
Zafrina parou logo atrás de mim, rindo, divertindo-se.
– Você está enferrujando, Sylas? Precisa de mais prática, não?!



- by Nique -
- O Filho da Noite -

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